Ações no STF contra Reforma da Previdência ameaçam aumentar rombo em R$ 206 bilhões

DA REDAÇÃO

O governo brasileiro enfrenta um risco iminente com o julgamento de diversas ações contra pontos cruciais da Reforma da Previdência, aprovada em 2019. Caso o Supremo Tribunal Federal (STF) decida desfavoravelmente em relação a quatro temas específicos, a União pode ser impactada em até R$ 206,4 bilhões, segundo estimativas da Advocacia-Geral da União (AGU). Além disso, se as decisões forem estendidas aos regimes previdenciários de estados e municípios, o impacto poderá ser ainda maior.

A Reforma da Previdência, que entrou em vigor em novembro de 2019, foi vista como uma medida essencial para equilibrar as contas públicas, com o objetivo de gerar uma economia de R$ 800 bilhões ao longo de dez anos. No entanto, mais de 15 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) questionam a constitucionalidade de vários trechos da reforma, e alguns julgamentos já estão empatados no STF ou com maioria formada para derrubar determinadas regras.

Impacto bilionário à vista

Entre os temas mais sensíveis que podem aumentar o rombo previdenciário estão questões como a contribuição linear de 11% para todos os servidores, a cobrança de contribuições extraordinárias para cobrir déficits atuariais e a ampliação da base de cálculo para a contribuição de aposentados e pensionistas. Esses pontos, se alterados pelo STF, podem gerar prejuízos significativos para os cofres públicos.

Uma das ações de maior impacto visa restabelecer a contribuição única de 11% para todos os servidores públicos, independentemente de sua remuneração. O placar atual no STF está empatado, e caso a medida seja aprovada, o impacto para a União será de R$ 73,8 bilhões. Com a reforma, foi introduzida a progressividade das alíquotas de contribuição, que variam de 7,5% a 22%, seguindo o modelo do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), aplicado aos trabalhadores do setor privado.

Contribuições extraordinárias

Outro ponto delicado em julgamento no STF é a possibilidade de a União cobrar uma contribuição extraordinária para cobrir o déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) dos servidores. Essa cobrança adicional pode ser aplicada tanto a servidores ativos quanto inativos, desde que recebam remuneração acima de um salário mínimo. Antes da reforma, essa contribuição só era exigida de funcionários com rendimentos superiores ao teto do INSS, atualmente em R$ 7.786.

Até o momento, a União não implementou essa contribuição extraordinária, apesar do déficit previdenciário no RPPS. No entanto, caso o STF decida pela rejeição dessa medida, o prejuízo pode chegar a R$ 71,4 bilhões, com maioria dos ministros já formada para derrubar esse trecho da reforma.

Além disso, a ampliação da base de cálculo da contribuição para aposentados e pensionistas, que permite a cobrança sobre todos os proventos acima de um salário mínimo em caso de déficit, também está sendo contestada. O STF já tem maioria para derrubar essa regra, o que adicionaria mais R$ 55,1 bilhões ao impacto total.

Ação das servidoras públicas

Outro ponto polêmico envolve a mudança no cálculo dos benefícios para servidoras públicas que perderam a integralidade e a paridade com a reforma. A integralidade garante que o servidor se aposente recebendo o valor equivalente ao último salário no cargo, enquanto a paridade assegura que os reajustes aplicados aos ativos sejam estendidos aos inativos.

A reforma modificou essas regras, estabelecendo que, após 20 anos de contribuição, o benefício seria calculado com base em 60% da média das contribuições, com acréscimo de 2% a cada ano adicional de serviço. O regime geral exige 15 anos de contribuição, mas as mulheres enfrentam mais dificuldades para alcançar esse tempo devido à falta de estabilidade no emprego. O STF, no entanto, já tem maioria formada para alterar o cálculo da aposentadoria, o que aumentaria ainda mais o impacto nas contas públicas.

Risco de contrarreforma

Especialistas em previdência alertam para os riscos dessas decisões. Leonardo Rolim, que atuou na concepção da Reforma da Previdência de 2019, afirma que as ações em andamento no STF configuram uma verdadeira contrarreforma, ameaçando um dos principais objetivos das mudanças, que era aproximar os regimes de previdência dos servidores públicos e do setor privado.

“É uma pena que isso esteja acontecendo, pois a reforma buscava estabelecer uma convergência necessária entre esses regimes”, afirma Rolim. Ele também destaca que, com o envelhecimento da população e o aumento da expectativa de vida, o Brasil poderá enfrentar ainda mais dificuldades para sustentar seu sistema previdenciário nos próximos anos. “Com essas decisões, o rombo da Previdência pode crescer ainda mais, exigindo novas reformas no futuro”.

Cenário de incerteza

Os julgamentos no STF foram suspensos por pedidos de vista e ainda não há uma data definida para a retomada das deliberações. Enquanto isso, o governo federal e a AGU monitoram de perto as decisões dos ministros, conscientes do impacto significativo que uma derrota judicial pode ter nas contas públicas. A reforma de 2019 foi considerada um marco para o ajuste fiscal, mas as ações em andamento colocam em risco a economia prevista e aumentam a pressão sobre o já elevado déficit previdenciário do país.

Diante desse cenário, a expectativa é de que novas discussões sobre a sustentabilidade da Previdência sejam trazidas à tona nos próximos anos, especialmente com a evolução das mudanças demográficas e os desafios econômicos que o Brasil enfrenta. A necessidade de equilíbrio fiscal permanece, e qualquer retrocesso nas conquistas da Reforma da Previdência poderá agravar a situação do país, tanto no curto quanto no longo prazo.