
O degelo no Ártico, intensificado pelas mudanças climáticas, não apenas não facilita a navegação comercial entre Europa e Ásia, como também torna essa travessia mais perigosa. Contrariando a crença popular, um estudo divulgado nesta quinta-feira, 11, revela que a Passagem do Noroeste, apesar de teoricamente reduzir a distância em cerca de 7.000 km devido à redução da camada de gelo, na prática apresenta riscos significativos devido à natureza do gelo.
A Passagem do Noroeste, que esteve intransitável por um século, gera interesse porque poderia teoricamente encurtar as rotas comerciais. No entanto, o estudo publicado na revista Communications Earth and Environment, liderado por Alison Cook, especialista da Associação Escocesa para as Ciências Marinhas, aponta que a realidade é quase o oposto do esperado. “Descobrimos que, na verdade, acontece quase o contrário”, explicou Cook à AFP.
De acordo com os resultados da pesquisa, o número de semanas anuais em que uma embarcação pode navegar com segurança pela Passagem do Noroeste diminuiu entre 2007 e 2021. Isso ocorre porque, embora a camada de gelo esteja diminuindo, o gelo mais antigo e espesso está se deslocando mais para o sul, criando gargalos perigosos.
Esses pedaços de gelo mais antigos e espessos representam um risco maior para as embarcações em comparação com as formações de gelo mais recentes, que são mais finas. Além dos riscos diretos apresentados pelo gelo, outros fatores complicam a travessia, como a falta de infraestrutura, a distância remota, a elevação do fundo do mar e os estreitos labirínticos.
Historicamente, a Passagem do Noroeste tem sido um desafio significativo para a navegação. Em 1845, a expedição do britânico John Franklin terminou em tragédia, com a perda total de suas duas embarcações. Somente em 1906, o norueguês Roald Amundsen conseguiu concluir a travessia pela primeira vez.
Nos últimos anos, o número de embarcações que se aventuram pela Passagem do Noroeste tem aumentado, embora ainda seja um número relativamente pequeno. De acordo com o Conselho do Ártico, o número de embarcações passou de 112 em 2013 para 160 em 2019, incluindo cargueiros, barcos de pesca, barcos de corrida e até um transatlântico com mil passageiros.
Um estudo de 2021 previu que a Passagem do Noroeste poderia se tornar navegável durante parte do ano se as temperaturas globais aumentassem em 2°C acima dos níveis pré-industriais. Contudo, isso ainda está longe de se tornar uma realidade, conforme o gelo mais antigo e espesso continua a se acumular na passagem, criando desafios contínuos para a navegação.
“Esse gelo mais antigo e espesso estará presente por muitos anos”, estimou Alison Cook. “Está mais para uma advertência”, acrescentou, observando que o número de viagens através do Ártico canadense quadruplicou desde 1990. O aumento do degelo, em vez de facilitar a navegação, torna a passagem mais perigosa e complexa, desafiando as expectativas iniciais.
As mudanças climáticas continuam a transformar as dinâmicas do Ártico de maneiras imprevisíveis, impactando tanto o meio ambiente quanto as atividades humanas na região. A navegação comercial entre a Europa e a Ásia, que poderia se beneficiar de uma rota mais curta, enfrenta desafios significativos devido às características do gelo remanescente e às condições geográficas adversas.
Este cenário destaca a necessidade de um planejamento cuidadoso e de investimentos em infraestrutura para mitigar os riscos associados à navegação na Passagem do Noroeste. Além disso, reforça a importância de uma abordagem global coordenada para enfrentar os impactos das mudanças climáticas, que afetam de maneira abrangente diversos setores da economia e do meio ambiente.
A expectativa de que o degelo do Ártico pudesse abrir novas oportunidades de navegação deve ser equilibrada com uma compreensão clara dos desafios e riscos envolvidos. A preservação da segurança e a minimização dos impactos ambientais negativos devem ser prioridades ao considerar a expansão das rotas comerciais através de regiões sensíveis e em transformação como o Ártico.
Enquanto a comunidade científica e as autoridades de navegação continuam a estudar e monitorar as mudanças na região, as descobertas atuais servem como um lembrete das complexidades e incertezas que acompanham as transformações climáticas globais. A adaptação e a resiliência serão essenciais para enfrentar os desafios futuros e aproveitar as oportunidades de maneira sustentável e segura.