
O governo federal determinou nesta segunda-feira (19) uma mudança profunda na estrutura do ensino superior no Brasil: está proibida a oferta de cursos de graduação exclusivamente na modalidade a distância para Medicina, Direito, Odontologia, Enfermagem e Psicologia. A decisão foi anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília, e faz parte do lançamento da Nova Política de Educação a Distância (EAD), estabelecida por decreto presidencial.
A nova regulamentação, articulada pelo Ministério da Educação (MEC), responde ao crescimento desordenado da modalidade EAD nos últimos anos e à crescente preocupação com a qualidade da formação em áreas sensíveis, como saúde e justiça. Segundo dados do próprio MEC, entre 2018 e 2023, o número de cursos EAD cresceu 232% no país. Em 2023, o número de ingressantes em cursos a distância foi o dobro dos ingressantes no ensino presencial.
Camilo Santana, ministro da Educação, destacou que a reformulação busca reposicionar o foco do ensino a distância no Brasil. “A prioridade é garantir uma formação sólida e responsável ao estudante, com valorização do corpo docente, da infraestrutura e do acompanhamento pedagógico. A EAD precisa ser instrumento de qualidade, não de massificação sem critérios.”
O novo marco define que cursos das áreas de saúde e licenciaturas poderão ser ofertados na modalidade semipresencial, com atividades práticas obrigatoriamente presenciais. Já os cursos de Medicina, Direito, Odontologia, Psicologia e Enfermagem devem permanecer exclusivamente presenciais, sem exceção. Para os demais, a modalidade híbrida passa a ter regras específicas.
Entre as mudanças mais relevantes está a criação formal da modalidade semipresencial, que combina atividades presenciais físicas (como estágios, extensão e laboratórios) com encontros online ao vivo (aulas síncronas mediadas). O objetivo é assegurar uma vivência acadêmica mais rica, aproximando a experiência EAD da estrutura dos cursos presenciais tradicionais.
A regulamentação também estipula novos limites para o número de alunos por professor nas aulas online ao vivo: serão permitidos, no máximo, 70 estudantes por docente ou mediador pedagógico. Essa limitação visa a valorizar o papel do professor e melhorar a qualidade da interação pedagógica.
Os polos de EAD serão reconhecidos oficialmente como unidades acadêmicas, exigindo estrutura mínima com laboratórios, acesso à internet, salas de coordenação e ambientes para estudo. O compartilhamento de polos entre instituições diferentes passa a ser proibido. O decreto determina ainda que cada disciplina dos cursos a distância deve conter pelo menos uma avaliação presencial, que representará a maior parte da nota final.
O texto também cria a figura do mediador pedagógico — profissional com formação compatível com o curso e vínculo formal com a instituição — com papel distinto do tutor, que tradicionalmente desempenhava apenas tarefas administrativas. O número de mediadores por curso deverá ser informado anualmente ao Censo da Educação Superior.
As instituições de ensino terão o prazo de dois anos para se adaptarem às novas regras. Durante esse período, poderão continuar ofertando os cursos com base nos modelos anteriores, mas já devem iniciar os ajustes nas estruturas físicas, currículos e vínculos profissionais exigidos pela nova política.
A decisão do MEC vem na esteira de outra medida tomada em 2024, quando o ministério suspendeu temporariamente a autorização de novos cursos EAD, vagas e polos, com o objetivo de reformular os referenciais de qualidade da modalidade. Agora, com o novo decreto, o governo busca consolidar um modelo mais equilibrado, que privilegia o aprendizado efetivo em detrimento da simples expansão numérica de vagas.
Os dados revelam ainda uma disparidade entre redes públicas e privadas: na rede pública, 85% dos ingressos ainda se concentram no ensino presencial, ao passo que, na rede privada, 73% dos alunos ingressam por meio do EAD. Essa diferença acentuou a preocupação do governo com a qualidade da formação oferecida à maioria dos estudantes brasileiros.
O Brasil possui atualmente mais de 3 mil municípios com estudantes matriculados em cursos EAD — o que representa 93% da população nacional. Para o MEC, essa capilaridade precisa ser acompanhada de responsabilidade e estrutura. “Educação não pode ser encarada como um serviço qualquer, mas como uma política pública que transforma vidas. Essa é a essência dessa nova regulamentação”, disse Camilo Santana.
A partir de agora, o desafio das instituições será encontrar equilíbrio entre acessibilidade, inovação tecnológica e a manutenção da qualidade exigida para formar profissionais competentes e bem preparados para o mercado. Com a medida, o MEC tenta restaurar a credibilidade da modalidade EAD e delimitar claramente os limites do ensino remoto no país.