
Durante sua participação na Cúpula do G7, no Canadá, nesta terça-feira (17), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva adotou um tom crítico contra os recentes ataques de Israel ao Irã, advertindo que o Oriente Médio corre o risco de se transformar em um verdadeiro campo de batalha. Em seu discurso, Lula evitou condenar as ações de Teerã e não mencionou o programa nuclear iraniano, em contraste com o comunicado oficial do G7, que defendeu o direito de Israel à autodefesa e condenou as ambições nucleares do Irã.
A declaração de Lula, feita diante de líderes das maiores potências econômicas do planeta, foi enfática: “Os recentes ataques de Israel ao Irã ameaçam fazer do Oriente Médio um único campo de batalha, com consequências globais inestimáveis.” A frase destacou sua visão sobre a escalada dos conflitos na região e marca uma clara divergência em relação à postura dos demais países do G7.
Ao abordar o tema da “segurança energética”, pano de fundo da sessão em que discursava, Lula interligou a instabilidade geopolítica às ameaças ao abastecimento global. “Tampouco haverá segurança energética em um mundo conflagrado. Ano após ano, guerras e conflitos se acumulam. Gastos militares consomem anualmente o equivalente ao PIB da Itália”, criticou.
O presidente brasileiro também aproveitou a ocasião para fazer uma crítica direta à inércia das grandes potências mundiais na mediação de conflitos. Segundo ele, “é patente que o vácuo de liderança agrava esse quadro”, em referência à paralisia das instituições internacionais diante da multiplicação de guerras pelo mundo.
A ausência de críticas ao Irã em sua fala contrasta com a posição dos demais líderes do G7, que demonstraram preocupação com o avanço do programa nuclear iraniano e reforçaram seu apoio a Israel após o ataque iraniano com drones. Lula, por sua vez, concentrou-se exclusivamente na ofensiva de Tel Aviv, ignorando o contexto mais amplo da tensão crescente entre os dois países do Oriente Médio.
Em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia, Lula reafirmou sua defesa por uma solução baseada no diálogo. Segundo ele, “nenhum dos lados conseguirá atingir seus objetivos pela via militar”. O presidente voltou a condenar a matança de civis em Gaza, afirmando que “nada justifica a matança indiscriminada de milhares de mulheres e crianças e o uso da fome como arma de guerra”.
O discurso de Lula também incluiu uma crítica indireta à guerra comercial em curso, protagonizada pelos Estados Unidos sob a liderança de Donald Trump. Ele se referiu a acordos internacionais envolvendo exploração mineral como novas formas de colonialismo. “O Brasil não será palco de corridas predatórias e práticas excludentes. Parcerias devem se basear em benefícios mútuos, não em disputas geopolíticas”, disse, em alusão ao pacto firmado entre EUA e Ucrânia para extração de minerais em troca de apoio militar.
Além da crítica velada à ação americana, Lula apontou o protecionismo econômico da China como outro fator desestabilizador. O presidente citou a redução das exportações chinesas de minerais de terras raras para os Estados Unidos e Europa como uma das causas de tensões crescentes. Como resposta, os líderes do G7 divulgaram um comunicado conjunto defendendo acesso seguro e sustentável a esses minerais, numa tentativa de limitar o domínio de Pequim sobre cadeias estratégicas.
Ao final de sua intervenção, Lula reiterou a necessidade de fortalecer a atuação da Organização das Nações Unidas (ONU) como mediadora de crises e conflitos. Ele criticou o esvaziamento da instituição nas últimas décadas e afirmou: “É o momento de devolver o protagonismo à ONU. É preciso que o Secretário-Geral lidere um grupo representativo de países comprometidos com a paz na tarefa de restituir à organização a prerrogativa de ser a casa do entendimento e do diálogo.”
Com sua fala no G7, Lula se distancia do consenso entre os países do Ocidente, sobretudo ao não criticar o Irã, o que pode gerar desconfortos diplomáticos. Por outro lado, reforça sua imagem de liderança independente no cenário internacional e reafirma o Brasil como um país que busca equilíbrio em meio à polarização global.
A posição de Lula já gerou reações entre diplomatas europeus, especialmente na França e na Alemanha, que consideraram o discurso “parcial e pouco equilibrado”. Nos bastidores, fontes ligadas ao Itamaraty defendem que o Brasil busca manter uma postura de neutralidade ativa, que permita sua atuação como mediador futuro em possíveis negociações de paz entre Israel e Irã.
A ausência de críticas ao Irã também tem implicações internas. A oposição já articula declarações públicas cobrando maior alinhamento do governo brasileiro com as posições adotadas por seus principais parceiros comerciais do Ocidente. Parlamentares da base aliada, no entanto, defenderam a fala do presidente como um posicionamento ético e coerente com a tradição diplomática brasileira de não intervenção.
A fala de Lula ocorre em um momento crítico das relações internacionais e reforça o papel do Brasil como voz alternativa em fóruns multilaterais. Se por um lado pode custar respaldo junto às potências ocidentais, por outro amplia sua influência junto ao Sul Global, especialmente entre países árabes e africanos que têm se mostrado desconfiados das ações de Israel e do Ocidente no Oriente Médio.
A cúpula do G7 ainda terá desdobramentos nos próximos dias, mas a participação de Lula já se destaca como um dos momentos mais comentados do evento, marcando a posição brasileira no tabuleiro internacional com uma abordagem crítica, pacifista e alinhada à multipolaridade.