
Em meio a um crescente confronto diplomático entre o Brasil e a França, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez duras críticas ao boicote francês aos produtos brasileiros, especialmente à carne bovina, e reafirmou a intenção de assinar o acordo entre a União Europeia (UE) e o Mercosul ainda em 2024. A declaração do presidente foi feita nesta quarta-feira (27), em resposta a um episódio polêmico ocorrido no Parlamento francês, onde deputados se opuseram de forma veemente ao acordo que está sendo negociado entre os blocos econômicos.
A Crítica de Lula e o Contexto Político
O episódio ganhou atenção internacional depois que, na terça-feira, 26, parlamentares franceses aprovaram uma declaração contra o acordo UE-Mercosul, que está em fase de negociação há mais de 20 anos. Durante a votação simbólica na Assembleia Nacional, 484 deputados dos 555 presentes validaram a posição do governo do presidente Emmanuel Macron, que busca um apoio unânime do Parlamento francês para pressionar a Comissão Europeia nas tratativas com os países do Mercosul.
A principal preocupação dos parlamentares franceses está relacionada à qualidade e rastreabilidade da carne produzida no Brasil e em outros países do Mercosul. A crítica foi tão forte que alguns membros do Parlamento chegaram a comparar a carne brasileira a “lixo”. O deputado Vincent Trébuchet, por exemplo, declarou durante a sessão: “A realidade é que nossos agricultores não querem morrer e nossos pratos não são latas de lixo”, uma frase que gerou indignação no governo brasileiro e no setor agropecuário.
O presidente Lula, ao reagir a essas críticas, declarou: “Eu quero que o agronegócio continue crescendo e causando raiva em um deputado francês que achincalhou os produtos brasileiros, porque nós vamos fazer o acordo do Mercosul, não tanto pela questão do dinheiro, mas porque estou há 22 anos nisso e vamos fazer”. Para o presidente, o boicote é um ataque infundado, e a disputa por tarifas e regulamentações não pode ser usada como desculpa para desacreditar a qualidade dos produtos brasileiros, que, segundo ele, atendem aos mais altos padrões de segurança e qualidade.
A Estratégia do Governo Brasileiro e a Resposta a Macron
Lula também fez questão de destacar que a França não tem poder de decisão sobre o acordo, ressaltando que o verdadeiro poder está com a Comissão Europeia, que tem autoridade para fechar o tratado. “Se os franceses não quiserem o acordo, eles não apitam mais nada, quem apita é a Comissão Europeia. A Ursula von der Leyen tem procuração para fazer o acordo, e eu pretendo assinar esse acordo este ano ainda”, disse Lula, afirmando que pretende tirar a questão da sua pauta política o quanto antes.
A resposta direta de Lula ao boicote francês também refletiu sua postura firme diante de pressões externas. Afirmando que o Brasil não se deixaria intimidar por ataques infundados, ele reforçou o compromisso com o setor agrícola nacional, destacando a importância de manter o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, independentemente das críticas e das resistências internas nos países europeus. “Nós vamos fazer o acordo e, se não for por questões econômicas, será porque é a coisa certa para o Brasil”, afirmou o presidente.
O Boicote e a Resistência dos Setores Agrícolas na França
O embate em torno do acordo Mercosul-UE não se limita apenas aos parlamentares franceses. O setor agrícola francês tem se mostrado cada vez mais resistente à ideia de uma maior abertura do mercado europeu para os produtos do Mercosul, especialmente a carne bovina, que, segundo eles, competiria diretamente com os produtos locais. Para os agricultores franceses, o receio é de que o aumento das importações de carne do Brasil possa afetar a competitividade do setor agrícola na França, onde os padrões sanitários e as exigências de rastreabilidade são considerados mais rigorosos.
Na França, a resistência ao acordo tem ganhado força, com protestos organizados por agricultores que bloqueiam estradas com tratores, uma ação que se intensificou nas últimas semanas. A ministra da Agricultura do país, Annie Genevard, expressou sua posição contra o acordo em sua forma atual, afirmando que a França rejeita “de forma plena e decidida” o texto, mas destacou que a oposição não é ideológica. Segundo Genevard, a preocupação está centrada na proteção dos interesses dos agricultores franceses e na garantia de que os produtos que entram no mercado europeu atendam aos padrões exigidos.
O Impacto Econômico e a Visão do Governo Brasileiro
Para o governo brasileiro, o acordo com a União Europeia representa uma oportunidade significativa para expandir o comércio e aumentar a competitividade dos produtos nacionais no mercado internacional. No entanto, a resistência da França pode representar um obstáculo a ser superado nas negociações, especialmente no que diz respeito aos produtos do setor agropecuário.
Lula tem enfatizado a importância de manter o mercado de carne bovina brasileiro competitivo e de garantir que o setor agropecuário continue sendo um pilar fundamental da economia nacional. A isenção de impostos, a criação de novas oportunidades de mercado e a ampliação da exportação de produtos agrícolas são prioridades do governo brasileiro, que vê no acordo com a União Europeia uma forma de solidificar o país como um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do mundo.
O Futuro do Acordo Mercosul-UE
Apesar da resistência interna e das dificuldades nas negociações, o governo brasileiro segue otimista quanto à possibilidade de assinatura do acordo Mercosul-UE ainda em 2024. A liderança de Lula e a posição firme do governo brasileiro visam não apenas assegurar melhores condições para o setor agropecuário, mas também fortalecer os laços comerciais e diplomáticos entre o Brasil e os países da União Europeia. O acordo representa uma vitória potencial para o comércio global, e o Brasil está determinado a garantir que seus interesses sejam preservados, independentemente das críticas e pressões externas.
O próximo passo será superar os desafios impostos pela resistência francesa e buscar um entendimento que beneficie todas as partes envolvidas. Se o acordo for assinado, o Brasil pode esperar uma expansão significativa de seus mercados e o fortalecimento da posição global do país no comércio de alimentos e produtos agrícolas.