Febre Oropouche: o que ainda precisamos descobrir sobre a nova ameaça no Brasil

Scott Bauer/Agricultural Research Service/United States Department of Agriculture/Divulgação
DA REDAÇÃO

O Brasil registrou mais de 7.200 casos de febre oropouche em 2024, incluindo as primeiras mortes conhecidas pela doença em todo o mundo. A febre oropouche, causada pelo vírus Orthobunyavirus oropoucheense (Orov), é um arbovírus transmitido principalmente pelo mosquito Culicoides paraensis, conhecido como maruim ou mosquito-pólvora. A doença apresenta sintomas semelhantes aos da dengue, como febre, dor de cabeça, dor muscular e nas articulações, mas ainda é pouco compreendida pela ciência.

Desde que o vírus foi isolado pela primeira vez em 1960, a febre oropouche tem sido relatada em surtos esporádicos, principalmente na região amazônica do Brasil. No entanto, o surto atual, que já resultou em mais de 7 mil infecções, levanta novas questões sobre a gravidade da doença e sua capacidade de se espalhar para outras regiões do país.

Apesar de décadas de conhecimento sobre o vírus, muitas lacunas permanecem. Ainda não se sabe exatamente como o vírus atua no organismo humano, sua capacidade de causar sintomas graves e sua virulência. Casos recentes, incluindo a morte de duas pessoas jovens e saudáveis, evidenciam a necessidade de uma compreensão mais profunda da doença.

Alexandre Piva, infectologista e professor do curso de medicina da Universidade Cidade de S. Paulo (Unicid), destaca que “várias pesquisas estão em andamento” para entender melhor a doença. Ele menciona a necessidade de identificar todos os animais que podem servir como reservatórios do vírus e todos os vetores responsáveis por sua transmissão. Além disso, é fundamental entender a resposta imunológica ao vírus e investigar a possibilidade de complicações como meningite e encefalite.

Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos profissionais de saúde é a falta de testes de diagnóstico rápidos e precisos para a febre oropouche. Sem essas ferramentas, é difícil diferenciar a doença de outras infecções transmitidas por mosquitos, como dengue, chikungunya, zika e malária. Um estudo recente publicado no periódico científico Zoonoses ressaltou a necessidade de mais pesquisas sobre a presença do vetor em surtos recentes, a compreensão dos reservatórios naturais e os fatores patogênicos do vírus que causam a doença em humanos.

O surto atual também levanta questões sobre a expansão geográfica da doença. Relatórios recentes indicam surtos não apenas no Brasil, mas também em outros países latino-americanos, como Cuba. Raquel Stucchi, infectologista e professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), aponta que o surto fora da região amazônica sugere mudanças no comportamento do vírus, possivelmente relacionadas à sua capacidade de causar doenças mais graves ou aumentar sua transmissibilidade.

Estudos preliminares sugerem que uma nova variante do vírus, denominada “novo oropouche”, pode ser mais agressiva do que a variante original. Pesquisas indicam que essa nova cepa pode se replicar até 100 vezes mais rapidamente e ter uma resposta imunológica mais robusta, o que poderia explicar o aumento na gravidade dos casos recentes.

Além das investigações sobre o vírus, há uma crescente preocupação com a possibilidade de transmissão vertical, ou seja, da mãe para o bebê. O Ministério da Saúde confirmou recentemente um óbito fetal associado à febre oropouche e emitiu um alerta para a notificação de casos de malformações fetais que possam estar relacionadas à infecção.

Outro grande desafio é a falta de tratamento específico para a febre oropouche. Atualmente, o manejo da doença envolve apenas o alívio dos sintomas, como febre e dor, por meio de repouso, hidratação e uso de medicamentos como antitérmicos. No entanto, como não se sabe se o vírus pode causar sintomas hemorrágicos, como a dengue, o uso de medicamentos anti-inflamatórios e corticóides é desaconselhado.

Diante da ausência de vacinas, a prevenção contra a febre oropouche depende de medidas para reduzir a exposição ao mosquito transmissor. Isso inclui o uso de roupas que cubram o corpo, aplicação de repelentes e eliminação de criadouros de mosquitos, como água parada em pneus, vasos de plantas e caixas d’água destampadas.

O surto atual de febre oropouche representa um desafio significativo para a saúde pública no Brasil e em outras partes da América Latina. À medida que as autoridades e os pesquisadores se esforçam para entender melhor a doença e desenvolver estratégias de prevenção e tratamento, a população é aconselhada a tomar precauções para evitar a exposição ao mosquito e a buscar atendimento médico em caso de sintomas suspeitos.

A situação destaca a necessidade urgente de mais pesquisas e desenvolvimento de ferramentas de diagnóstico, tratamentos específicos e, eventualmente, uma vacina para combater a febre oropouche e evitar que a doença continue a se espalhar e causar mais vítimas.