
Em uma reunião realizada na Câmara dos Deputados nesta terça-feira, 1º de abril de 2025, especialistas em saúde pública, meio ambiente e direitos indígenas reuniram-se para lançar um plano de mitigação dos impactos da contaminação por mercúrio na Amazônia. O evento contou com o apoio das Frentes Parlamentares Ambientalista e dos Povos Indígenas, além da participação da ONG WWF-Brasil. A iniciativa visa reduzir os danos causados pela exposição ao mercúrio, especialmente nas áreas afetadas pelo garimpo ilegal de ouro, e proteger as comunidades tradicionais que dependem dos recursos naturais da região.
O Desafio da Contaminação por Mercúrio
A analista de políticas públicas da WWF-Brasil, Ariene Cerqueira, fez um alerta sobre a gravidade da situação: “Estamos falando de saúde pública. Mesmo que todas as operações que emitem mercúrio sejam paralisadas agora, a contaminação ainda continuará afetando as populações por muitos anos”. Ela destacou que a questão não está limitada às áreas de garimpo, mas também se espalha para os centros urbanos, atingindo a saúde das pessoas que consomem peixe contaminado. Segundo Cerqueira, a contaminação por mercúrio afeta diretamente a segurança alimentar e hídrica das comunidades, além de prejudicar o direito à saúde das populações que dependem desses recursos.
O Plano de Mitigação dos Impactos do Mercúrio
O Plano de Mitigação dos Impactos do Mercúrio no Ambiente Amazônico e em suas Populações, lançado pelos especialistas, propõe ações concretas para lidar com a contaminação. O plano, que tem 68 páginas, foi elaborado por cientistas, pesquisadores e lideranças de comunidades tradicionais. As principais estratégias incluem o monitoramento contínuo dos níveis de mercúrio nos rios e na saúde da população, com ênfase na análise da contaminação nos peixes consumidos pela população amazônica. Gabriela Fonseca, professora da Universidade Federal do Pará, explicou a importância desse monitoramento abrangente: “O rio anda e o peixe anda, então, estamos comendo peixe contaminado em todos os lugares. A questão não é se eu tenho mercúrio no meu corpo, é quanto de mercúrio eu tenho no meu corpo”.
Além do monitoramento, o plano sugere instalar sistemas de tratamento de água, proteger nascentes e áreas de preservação permanente, e fortalecer a fiscalização para evitar novos focos de contaminação. A proposta visa, também, a implementação de programas regionais para acompanhar a qualidade do peixe na região amazônica e identificar a presença de mercúrio nos alimentos consumidos pela população.
A Legislação e a Defesa de um Ambiente Livre de Mercúrio
Linara Assunção, professora da Universidade Federal do Amapá e especialista em Direito Ambiental, defendeu a aprovação do projeto de lei (PL 1011/23), que propõe a criação de uma Política Nacional de Prevenção da Exposição ao Mercúrio. O PL ainda está em análise no Senado, e, caso aprovado, poderá estabelecer diretrizes mais claras e rígidas para o combate à contaminação por mercúrio no Brasil. Para Assunção, a proposta é essencial para proteger as populações mais vulneráveis e o meio ambiente da Amazônia.
O coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), enfatizou que o plano de mitigação é uma ferramenta importante para superar a resistência de setores do Congresso, que têm se oposto a projetos mais rigorosos. “Tramitam projetos para proibir o uso do mercúrio, seja na exploração mineral, seja no tratamento dentário, mas há grande resistência”, afirmou Tatto. Ele também mencionou seu próprio projeto de lei (PL 2417/24), que visa proibir o uso de mercúrio na exploração mineral, especialmente no garimpo de ouro.
A Resistência e a Luta Contra a Mineração Ilegal
A deputada Célia Xakriabá (Psol-MG), coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, criticou duramente os setores econômicos que tentam barrar esses projetos. “Há mais de mil projetos de lei que afetam diretamente os territórios indígenas e a questão ambiental. Precisamos falar de uma economia que não nos mate, uma economia sustentável”, afirmou Xakriabá. Ela também anunciou que o combate ao uso de mercúrio será um dos principais temas a serem discutidos nas preparações para a COP 30, a cúpula climática que ocorrerá em novembro de 2025, em Belém (PA).
O uso indiscriminado de mercúrio nas atividades de garimpo ilegal de ouro tem causado danos irreparáveis ao meio ambiente e à saúde das populações locais. A contaminação por mercúrio afeta não só a fauna e a flora, mas também os seres humanos, que podem sofrer com intoxicações e doenças graves, como danos neurológicos, problemas respiratórios e infertilidade.
O Desafio de Implementar Políticas Ambientais no Brasil
A contaminação por mercúrio é um dos maiores desafios ambientais e de saúde pública do Brasil. A mineração ilegal, em particular, é um dos principais responsáveis pela disseminação desse elemento tóxico. Embora haja resistência no Congresso a propostas mais rigorosas, a pressão das organizações sociais, movimentos indígenas e ambientalistas tem sido crescente, e a sociedade civil se mobiliza para garantir que políticas de proteção ao meio ambiente e à saúde sejam implementadas de forma eficaz.
O plano de mitigação é uma resposta concreta a essa crise, mas sua implementação dependerá de um forte apoio legislativo e político, especialmente em um cenário em que interesses econômicos poderosos, como o setor mineral, frequentemente entram em conflito com os direitos das populações locais e com as necessidades de preservação ambiental.