Brasil Suspende Vistos para Funcionários da BYD Após Resgate de Trabalhadores em Condições Análogas à Escravidão

DA REDAÇÃO

O Brasil, por meio do Ministério das Relações Exteriores, decidiu suspender temporariamente a emissão de vistos para os funcionários chineses da montadora BYD, após a constatação de condições de trabalho análogas à escravidão em uma das obras da empresa. A decisão foi tomada após uma operação coordenada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), que resultou no resgate de 163 trabalhadores em Camaçari, na Bahia, onde a BYD constrói sua primeira fábrica de veículos elétricos na América Latina.

A medida de suspensão dos vistos de trabalho, que inclui os vistos do tipo Vitem V, concedidos para trabalhadores estrangeiros, foi anunciada pelo Itamaraty em 23 de dezembro de 2024. Com isso, as representações diplomáticas brasileiras na China foram instruídas a interromper a emissão de documentos para colaboradores da BYD até que a empresa forneça esclarecimentos à Justiça e tome as providências necessárias para corrigir as irregularidades constatadas.

A investigação do MPT, que contou com o apoio da Polícia Federal e outras entidades, revelou uma série de abusos nas condições de trabalho. Os operários, em sua maioria, eram empregados por uma empresa terceirizada, a Jinjang Construction Brazil Ltda, e enfrentavam condições desumanas no local de trabalho. Entre as irregularidades, destacam-se o alojamento inadequado, com camas sem colchões e a falta de armários pessoais, e um refeitório em condições precárias, sem os mínimos requisitos de higiene. As instalações sanitárias eram insuficientes para o número de trabalhadores, agravando ainda mais o quadro de desrespeito às condições básicas de dignidade humana.

Além das condições de alojamento, a fiscalização do MPT revelou indícios claros de trabalho forçado. Os funcionários estavam sujeitos a uma retenção salarial ilegal, na qual 60% de seus salários eram retidos, sendo pagos apenas 40% de seus vencimentos. A situação se tornava ainda mais difícil, pois os trabalhadores recebiam os pagamentos em moeda chinesa, o que dificultava sua conversão no Brasil. Além disso, as rescisões contratuais eram dificultadas por cláusulas que prejudicavam os direitos dos empregados, e os passaportes dos trabalhadores eram retidos pela empresa, impedindo que eles retornassem ao seu país de origem.

Outro ponto alarmante foi a carga horária excessiva a que os operários eram submetidos. As jornadas de trabalho chegavam a 10 horas diárias, com intervalos irregulares, muitos dos quais eram feitos sobre materiais de construção. Os trabalhadores também estavam expostos a condições de trabalho extremamente perigosas, com exposição à radiação solar intensa sem qualquer tipo de proteção adequada. O resultado foi o aumento de acidentes de trabalho, devido à combinação de jornadas extenuantes e falta de segurança.

Diante da gravidade da situação, a Jinjang Construction Brasil Ltda, responsável pela contratação dos trabalhadores, negou as acusações, alegando que as alegações do MPT estavam inconsistentes com os fatos. Em resposta, a BYD informou, por meio de uma nota oficial, que rompeu o contrato com a construtora terceirizada e que estava providenciando a transferência dos 163 funcionários resgatados para hotéis na região, em uma tentativa de mitigar os danos causados.

O caso é um grande revés para a BYD, que havia escolhido Camaçari como o local para estabelecer sua primeira unidade industrial na América Latina. A fábrica de veículos elétricos da montadora chinesa, que foi anunciada como um marco no setor automotivo brasileiro, agora enfrenta um grande desafio de imagem e reputação devido às acusações de trabalho escravo. A BYD, que havia investido significativamente na operação, verá seu projeto prejudicado se não resolver rapidamente as questões trabalhistas e de conformidade com a legislação brasileira.

A decisão de suspender os vistos temporariamente é uma ação preventiva, até que a BYD apresente um plano de adequação às normas trabalhistas do Brasil e resolva as irregularidades apontadas pelo MPT. O Ministério do Trabalho, por sua vez, está acompanhando de perto o processo e pode implementar medidas adicionais para garantir que a empresa cumpra a legislação. Caso a montadora não atenda às exigências legais, poderá enfrentar sanções mais severas, incluindo multas e a interdição parcial ou total de suas operações no país.

O caso traz à tona mais uma vez a questão do trabalho escravo no Brasil, especialmente no contexto de empresas estrangeiras que, muitas vezes, não se adaptam às exigências trabalhistas locais. A questão do trabalho escravo tem sido uma preocupação constante no país, com o governo brasileiro tomando medidas para combater esse tipo de exploração. No entanto, a presença de grandes empresas internacionais, como a BYD, mostra que ainda existem desafios a serem superados para garantir que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados de forma plena.

O resgate de 163 trabalhadores em Camaçari é um lembrete de que, apesar dos avanços no combate ao trabalho análogo à escravidão no Brasil, o problema persiste, especialmente em setores como a construção civil e a indústria. A atuação do MPT e de outras instituições é essencial para identificar e combater essas práticas, mas também é fundamental que as empresas, especialmente as que atuam em setores estratégicos, como a indústria de veículos elétricos, se comprometam com a responsabilidade social e ambiental em suas operações.